Sergio Garrido Moraes |
![]() |
![]() |
|
Algumas das palavras de ordem no marketing atual são a microsegmentação, individualização, database marketing, e outras que apontam para o conhecimento cada vez mais detalhado do consumidor, suas preferências e hábitos. A união da competição cada vez mais acirrada com o desenvolvimento veloz da informática, leva os homens de marketing a buscarem o atendimento das necessidades de grupos cada vez menores de consumidores, tendo como o limite o atendimento a cada indivíduo, em oposição ao marketing de massa, herança dos anos 60 e da explosão da televisão aberta. No entanto, as ferramentas utilizadas para aprimorar esse conhecimento acerca dos consumidores ainda são, no Brasil, um tanto rudimentares.
Ainda se vê uma ênfase exagerada na utilização de critérios demográficos e geográficos para a segmentação de mercado, e, mesmo assim, esses critérios são freqüentemente mal utilizados. A classe econômica ainda parece ser, para muitos homens de marketing, o determinante do consumo, como se a mera posse de bens e nível de instrução - base para a divisão da população em classes A, B, C, D e E - fosse a condição única para a compra de determinados bens. Dentre os recursos pouco explorados para o mapeamento e compreensão do mercado está a segmentação por benefícios, ferramenta poderosa mas ainda utilizada timidamente.
Os critérios demográficos de segmentação apenas descrevem o comportamento de um segmento, sem avançar na sua explicação. A segmentação por benefício, ao requerer "o levantamento dos principais benefícios que as pessoas desejam de uma determinada classe de produtos, os tipos de pessoas que desejam cada benefício e as principais marcas que contém esses benefícios" (Kotler, Armstrong: pág. 155), permite uma melhor compreensão da dinâmica de mercado, contribuindo para o desenvolvimento de produtos e de campanhas de divulgação mais adequados.
Os critérios mais utilizados para a segmentação do mercado acabam por colocar lado a lado consumidores bastante diferentes. O perfil mais visado por fabricantes de bens de consumo - mulheres, 25 a 35 anos, classe A/B, casadas, com dois filhos - esconde diferenças às vezes sutis, às vezes gritantes entre padrões de decisão de compra. Nesse grupo estão desde a "perua", exibicionista, até a dona-de-casa, tradicional e comportada. Mesmo que se incorpore características de personalidade aos critérios de segmentação, ainda assim faltará a explicação das razões de compra.
Ao utilizarmos a segmentação por benefício, partimos da definição básica de produto: "qualquer coisa que possa ser oferecida a um mercado para satisfazer uma necessidade ou desejo" (Kotler, Armstrong: pág. 3). Ou seja: os consumidores compram esperança de se tornar mais bonitos e compram buracos, não compram cosméticos nem brocas. Estes são apenas os meios de se obter a satisfação de uma necessidade (Kotler, Armstrong: pág. 173). Quando efetuamos cortes no mercado a partir do que é realmente comprado - os benefícios - estamos falando a mesma linguagem do consumidor, e é possível desenvolver produtos mais adequados e campanhas de comunicação mais eficazes.
O primeiro passo para a segmentação
de mercado por benefícios é determinar quais são os
benefícios desejados. Os consumidores irão buscar, de acordo
com as suas próprias perspectivas, os produtos que atendam a essas
expectativas (Engel, Warshaw, Kinnear: pág. 225). A listagem de
que benefícios são importantes até se chegar ao desenho
de cada segmentos envolve três fases:
A maioria dos estudos de segmentação de mercado por benefícios obtém um número de segmentos entre 4 e 5. Esse número pode ser relativo a benefícios individuais ou a grupos de benefícios com características próximas. É importante frisar que, mesmo que o número de benefícios procurados seja bem maior, um número exagerado de segmentos pode não ser operacional para se trabalhar, e também que alguns benefícios ou grupos podem ter uma importância muito pequena.
Por outro lado, os consumidores quase sempre não se atém a apenas um aspecto em sua decisão de compra. Essa decisão pode se dar por um dos seguintes processos:
Uma categoria de produto interessante para ser analisada é a de calças jeans. Apesar de vestuário ser uma categoria de produto onde o estilo de vida é mais determinante para a compra, o caso das calças jeans parece ser bem interessante para se pensar em uma proposta de segmentação por benefício, por ser um produto bastante homogêneo, quando analisado pelas suas características intrínsecas, mas bastante diferenciado na hora da compra.
Todas as calças jeans são feitas de um metro e pouco de um mesmo tipo de tecido, fabricado por umas poucas empresas; todas têm basicamente os mesmos componentes (botão, linha, zíper, etiquetas, etc.) e são clones da calça Levi´s 501, o primeiro modelo a ser lançado, em 1850. Como, então, algumas são vendidas por R$ 12,00 e outras por R$ 100,00?
Se o produto físico é bastante similar, a imagem que os consumidores percebem em cada marca é bastante diferente, a partir da identidade que cada uma constrói.
Algumas marcas posicionam-se como exclusivas, seletivas, para um grupo selecionado de compradores, sendo, portanto, obrigatoriamente caras. Aqueles consumidores que buscam prestígio e destaque junto a seu grupo de referência irão ter essa necessidade satisfeita com a compra desse produto, independente de preço: é o caso do office-boy que gasta seu salário todo na compra de um jeans Forum (no mês seguinte, comprará um tênis Nike com três cheques pré-datados).
Outras marcas buscam ser o ícone de um determinado grupo, transformam-se em uniforme de certas tribos. O jeans da M.Officer, durante muitos anos, foi o uniforme das patricinhas: todas com o mesmo corte de cabelo, o mesmo lencinho, o mesmo jeans, a mesma camiseta (mais recentemente, sempre do Hard Rock Café). Símbolo de contestação e rebeldia durante décadas, o jeans passa a ser fator de identificação de jovens conservadoras. Quando as mães começaram a usar o mesmo jeans que elas, porém, todas migraram horrorizadas para a Les Filós...
Certas marcas têm seu apelo em fatores de moda (ou melhor: modinha, no sentido de algo descartável e efêmero, que não segue um ciclo). São compradas por pessoas que querem ser diferentes em seu grupo de referência, que não se conformam em estar iguais a todos os outros. Frisos, bordados e aplicações colocados sobre a mesma estrutura de um jeans básico, de 5 bolsos, trazem a satisfação de não ser parte da massa. Pela curta duração desses produtos - mesmo porquê, em pouco tempo, muita gente estará usando o mesmo elemento que um dia foi um diferencial - são itens baratos, encontrados em lojas populares, poucas vezes em lojas caras de shopping centers.
Outros consumidores pouco se importam com moda, prestígio, ou identificação: o jeans é apenas uma forma prática - e barata - de se vestir. O que importa é durabilidade, conforto e não o nome que vai escrito no bolso traseiro. A calça pode muito bem ser apenas um item a mais na lista de compra do hipermercado, adquirida sem nenhuma emoção especial.
Alguns consumidores, ainda, adotam padrões de consumo que podemos chamar de "globais": são aqueles plugados no mundo, conectados à Internet, que trocam e-mail com pessoas de vários países, e que têm referências mais próximas aos moradores de Londres e Nova Iorque do que com seus conterrâneos de Salvador ou Goiânia. Esses consumidores podem encontrar nas marcas internacionais de jeans uma satisfação para essa necessidade de ter referências globais. Esse grupo, porém, é um caso a ser analisado e quantificado: pouco representativo em termos numéricos, tende a ser, no entanto, grande comprador de certas categorias de produto, podendo ser um nicho de mercado ainda pouco explorado por marcas como Lee, Levi´s e Wrangler na comunicação desse tipo de produto.
A partir dessa rápida descrição,
podemos fazer uma leitura simplificada desse mercado utilizando o benefício
como ponto de partida para a construção de segmentos de mercado,
como pode ser visto no quadro a seguir:
Quadro 1
Segmentos de benefícios | Características demográficas | Características psicográficas | Características comportamentais | Marcas favorecidas |
Prestígio | adolescentes e jovens solteiros | orientação por imagem | light users, não fiéis (buscam a marca de prestígio no momento) | Forum, Zoomp |
Identidade | adolescentes | orientação por imagem, alto nível de recursos | heavy users, extremamente fiéis, mas por prazo restrito | M.Officer, Les Filós |
Economia | jovens, adultos | orientação por princípios | light users, não fiéis a marcas | marcas de hipermercados, pontas de estoque |
Modinha | adolescentes, jovens | orientação por imagem, baixo nível de recursos | heavy users, nãofiéis a marcas | marca não tem importância (fabricantes do Brás e Bom Retiro) |
Global | adultos | orientação por princípios, alto nível de recursos | medium users, fiéis a marcas | Levi´s, Lee, Wrangler |
Fonte: baseado em Kotler, Armstrong: pág. 155
Engel JF, Warshaw MR, .Kinnear TC - Promotional Strategy: Managing the Marketing Communication Process. Boston: Irwin, Himewood, 1991.
Kotler P, Armstrong G - Princípios de Marketing. Rio de Janeiro: Prentice Hall, 1993.
![]() |
Prof. Sergio Garrido Moraes Desde 24/05/99 |
![]() |